03/06/2014

Um outro olhar sobre os meus partos. {O renascimento do parto}


“Nós combinamos com o bebê que ele vai nascer sexta-feira às quatro da tarde? E se combinamos, ele respondeu pra gente que ele tem condições de nascer? Essa combinação é impossível de haver. Essa combinação não existe.” (Pediatra, Ricardo Chaves)
Tirei essa foto hoje. Sei que não se trata de uma imagem bonita e eu compreendo se você repudia a minha cicatriz. Eu também sinto o mesmo por ela.
Essa marca podia ser poética. Afinal de contas, meus filhos a tiveram como porta pra vida, foi por esse corte que Maria e José foram arrancados. ARRANCADOS!
Fotografei minha cicatriz e fiquei olhando, como pode o momento mais feliz da minha vida trazer como marca uma coisa tão horrenda? Suspirei.

Enfim eu consegui assistir ao filme o "Renascimento do parto". E me senti vazia. Enganada. E tantas coisas ruins sobre mim. 
Maturei a ideia, só assim pra tirar de mim uma responsabilidade que não me cabia. Obstetras que deveriam ser os maiores parceiros, viraram vilões da industria de partos. E eu fui uma das máquinas deles. Reconheço.

Quando eu engravidei de Maria, sonhei até o último instante com parto normal. Fui até as 40 semanas de espera. Tive até quase 4cm de dilatação (que me foi dito que não progrediria, o que nesse filme vi se tratar de mais uma manobra).
Até ser golpeada com a notícia da cesárea. Fui alertada sobre um possível sofrimento fetal. Foi jogado sobre mim a responsabilidade de decidir sobre a vida Maria. 
Eu estava sozinha numa sala quando ele me contou da redução de batimentos cardíacos e de como Maria seria imensa, que o parto demoraria horas, que não tinha remédio para induzir o parto (sim, num dos únicos hospitais particulares da cidade, de acordo com o DR. não havia remédio para induzir um parto). Olhando pra mim ele proferiu a pergunta que mais parecia um tiro: "Você ainda quer tentar, mesmo sabendo de tudo isso?".
Como eu poderia responder?
Chegando ao quarto, minha mãe (que pariu duas vezes de parto normal, sendo o meu parto feito por parteira) estava ao meu lado, mesmo carregada de experiência, também se rendeu a oferta de uma cesárea. Hoje compreendo, ela também não queria nos perder.
Eu não tinha conhecimento cientifico para decidir sobre o meu parto. Não foi justo.
Tive uma gravidez saudável, preparei o corpo e alma durante 40 semanas e terminei sendo cortada, ponteada e não tive a chance de ter um parto orgânico.
Maria nasceu saudável e ele não foi o herói dessa causa, eu fui a heroína, a melhor casa e fonte de saúde pra ela. Eu não precisava de uma cesárea. Eu precisava de tempo, apoio e informação.

Eis que veio José. Senti de novo minha chance de parir. Fui cozinhada em banho Maria por uma médica renomada. Médica essa que é referência no IMIP. (Para saber o que é o IMIP clique aqui.)
Sempre que o assunto era o meu parto, ela trocava de assunto, imediatamente.
Certo dia, ao vê-la com a bata do IMIP não contive o alívio e questionei ela sobre como eram os partos de lá, e na mesma frase contei sobre a vontade do parto normal.
Fui cortada na metade do raciocínio. Montou-se o circo do terror.
Me contou sobre ruptura uterina, do pouco tempo de um parto para outro, sobre a pressão ser muito baixa. E com voz firme me intimidou dizendo:  - Seu parto eu só faço cesárea, viu? Diga logo se topa, caso nãp paramos o pré-natal por aqui e eu indico a você um médico que faça, ou você procura por um.
Fiquei mais uma vez sem chão.
Li e reli sobre ruptura uterina no google, busquei em fóruns e artigos, esclarecimentos sobre o assunto. Mas, eu não teria o apoio de todos, como eu contestaria o que uma médica disse com uma base de dados do google?
Eu estava sozinha. Dentro de mim sempre ecoou uma voz que me mandava trocar de médica, buscar outra opinião, mas eu deveria?
Dei o passo tarde demais...
Depois de me desentender com essa Dra., fui recebida por outra, simpática, atenciosa e com voz de anjo. Fui bem acolhida.
Obviamente ela também descartou o parto normal e mesmo batendo palmas para os meus exames perfeitos, falava que o parto normal teria que ser descartado.
Eu deveria ter mudado de novo? Talvez. Mas eu já estava com 37 semanas, e não mudei.
Com 39 semanas José nasceu por meio de uma cesárea.
Em menos de um mês, José Luiz teve problemas respiratórios, e assim que a pediatra de plantão tomou ele nos braços, me perguntou: - Ele nasceu de cesárea como menos de 40 semanas, certo?
Chegava em mim a sequela da pressa, em mim não, pior ainda, nele. Talvez essa culpa eu carregue pra sempre.

Nas duas cirurgias colocaram sonda em mim. Mesmo com a minha mãe contestando sobre o pq da sonda. Perguntando se era realmente necessário, se eu não podia fazer xixi numa aparadeira.
Nas duas vezes que usei a sonda de urina, depois de retiradas, adquiri infecções sérias.

No parto de José eu fui dopada.  Estou digitando isso com os olhos cheios de lágrimas, tomados por revolta e tristeza.
Mesmo contra a minha vontade. Eu pedi diversas vezes a ela que não me dopasse no final do parto. Eu queria ficar acordada. Eu decidi ficar acordar. Falei isso ao meu marido também, ele viu meu pedido de consciência.
Mas, não fui respeitada. Dormi. E não me pergunte por quantas horas, eu não sei.
Despertei grogue. Algumas pessoas foram me visitar, falaram comigo e eu não tenho sequer uma lembrança disso.
Meu filho nasceu às 19:25h e só veio pra mim depois das 23:00h. Ele ainda não tinha sentido sequer o gostinho do meu colostro ou o meu cheirinho de mãe.

No parto de Maria tive os braços amarrados com tanta força, que fiquei com vergões roxos por mais de 15 dias, meu braço todo doía. Fiquei largada numa sala fria, sozinha. 
Me tremia toda sem saber que aquilo era uma reação da anestesia. Enfermeiras passeavam ao meu lado e quando eu interpelei uma sobre os temores, sem paciência ela respondeu: -É normal!

São tantas as atrocidades que envolvem esse mundo de partos. 
A violência obstetrícia que ecoa nas salas e findam nos silêncio das grávidas, que viram reféns das práticas cruéis, em busca do fim daquilo tudo e de ter em seus braços seus filhos.

A cada cena que eu assistia eu tinha vontade de chorar.
Nenhum dos meus filhos mamou em mim na sala de parto. Nenhum deles teve meu calor assim que nasceu. Foram aspirados, usaram colírio, tiveram seu cordão umbilical cortado imediatamente...
Foi tudo errado!

Uma das Obstetras do filme, falou algo sobre o bebê se sentir abandonado. Como é estressante e triste sair do seu canto predileto e até então única casa, por meio de uma cesárea. Cirurgia essa que não foi agendada com o bebê. Quem consultou ele sobre querer chegar naquele dia? Como precisar que ele estava pronto para aquilo? Como é cruel não ter a mamãe ou o papai por perto para afagar com amor o susto de conhecer o novo.

No filme eu também compreendi que tudo que foi me dito para antecipar e fazer a cesárea, tratava-se de "estratégias". Sim, estratégia para me convencer que seria a melhor saída.
A maioria das grávidas mostradas no filme, tiveram histórias parecidas com a minha.

Pra mim foi um filme revelador, eu renasci depois dele.
Me culpei por não ter mudado de médico quantas vezes fossem necessárias, por não ter estudado mais, ou ter me planejado melhor. 
Me entristeci por não ter parido de forma NORMAL meus dois rebentos, e por não ter sentido aquela dor, dor de amor.

Uma Doula fala no filme, sobre o medo que é imposto sobre a dor do parto normal. E ela alerta que a maioria das mulheres sofrem mais com os erros da equipe, com a crueldade dos procedimentos e não com a dor em si.
Barrigas são empurradas, médicos que sobem (sim, sobem!) em cima da barriga da parturiente, ocitocinas, cortes indesejados...

Eu não tive um parto vaginal. Fui refém da cesárea. 
Recomendo a todos que assistam ao filme "O renascimento do parto", que se permitam conhecer e que compreendam que nosso corpo foi feito para parir de forma natural.
Tenha ao seu lado um bom profissional, que você confie e acima de tudo sinta-se bem.
Se for o caso, mude, mude quantas vezes for preciso. Mas encontre quem traga ´para o seu filho a melhor e mais saudável opção de parto. 

Que fique claro que eu não sou contra a cesárea e muito menos contra a discriminação que as mães que passaram por esse procedimento sofrem, sendo elas tão enganadas e embriagadas de medo como eu. 
A cesárea salva milhares de vidas, quando necessária. Mas, queremos cesáreas se estivermos doentes, se elas realmente forem única solução. Se durante o trabalho de parto, o médico entenda e me comunique que é a melhor saída.

Eu não tenho planos para um terceiro filho. Financeiramente (principalmente) seria inviável. Mas, se as coisas tomassem outro rumo e eu pudesse receber em meu ventre outro fruto, eu lutaria pelo direito de deixar meu corpo e meu filho decidirem a hora.  Eu optaria de olhos fechados por deixar meu filho vir ao mundo, assim como eu cheguei, NORMALMENTE.

A mulher teve seu corpo arquitetado pra isso. A mulher é capaz de parir por si mesma, fomos feitas pra isso, simples.

   

6 comentários:

  1. Que texto fantástico, embora homem sei q não irei compartilhar essa dor do parto, mas você me fez emocionar com a leitura. Tenho muito medo dessa modernização que só pensa em dinheiro. Me entristece muito saber que profissionais fizeram de um momento supostamente mágico para você, sessões de tortura. Compartilhar essa experiência pode ajudar as mães a terem mais humanização na hora de dar a luz ao tão amado filho. Parabéns Lari

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    1. Obrigada, André. Esse é meu objetivo, que as mulheres não passem pelo o que eu passei, que busquem pessoas que respeitem o parto ogânico e normal como ele é, e como fomos feitas para parir.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Anadeje Maria do Nascimento4 de junho de 2014 às 15:11

    Meu deus essa mulher falou tudo que carrego desde 1987 quando tive minha primeira filha, tive três filhos cessarias e pra minha maior dor é não ter tido o meu 4º menino, que tenho certeza que eu o teria, se eu não fosse brutalmente impedida pelo meu ex-marido, Na ultima cessaria a médica tirou minha trompas porque a médica disse que meu marido não queria outro filho. Depois do parto tive depressão pós parto e ai a minha ficou uma lacuna, mesmo tendo meu 03 filhos ás vezes acho que não superei.

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    1. Anadeje, não se torture assim. Graças a Deus você tem 3 rebentos. Vida que segue, viu? Beijos!

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  4. Meu 1º parto foi ' fórceps ' passei por todas torturas imagináveis e msm 28anos após guardo sequelas ,o 2º n foi melhor ' fui obrigada pela família do marido ' a me submeter com um carniceiro (sim,pq aquele homem me mutilou) a cesárea e eu só tinha 24anos , a mim nunca foi dado o direito da palavra...do q achava...do q eu sonhava , apenas ouvia a frase; pobre n pode ter filhos !!! Durante anos me senti frustada ,roubada no direito de decidir algo em relação ao meu corpo...foram anos mastigando uma dor torturante. Sempre quis mais filhos e cada ano q passava eu tinha certeza q a unica coisa q sabia fazer e ser era ser mãe, guardei essa esta vontade por anos e há 6anos meu caçula chegou (por outra barriga claro) Tenho 29anos de casada,tenho 3 filhos . Qnto ao pobre q escutei diversas vezes no passado , só tenho um recado a dizer "o mundo dá voltas" ,hj posso me dar ao luxo de não trabalhar e cuidar 24h do meu filhote ,meu casebre e meus bichinhos. Abços Mª Morais.

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Eu, a Maria e o José, vamos adorar um recadinho.

 
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